Autor:Daniel Boaventura
Fonte: http://www.paroutudo.com/colunas/daniel/040926_danielboaventura_evangelicos.htm
Fé
Evangélicos representam ameaça aos gays brasileiros?
26.09.04
Por Daniel Boaventura
O Brasil tem mais de 30 milhões de evangélicos, o que representa 17% da população do país.
De acordo com o IBGE, caso a igreja evangélica permaneça com a taxa de crescimento dos dias atuais (mais que o triplo do registrado anualmente pela população), os evangélicos representarão 50% dos brasileiros em 2019.
Como se sabe, o segmento evangélico considera a homossexualidade pecado e doença.
A suposta predominância da religião evangélica no Brasil em 15 anos pode se constituir uma ameaça à inclusão social dos gays brasileiros?
O preconceito tende a aumentar?
Os poucos direitos alcançados pelos homossexuais brasileiros estão com os dias contados?
Apesar do impacto que a notícia traz, há bons ventos sinalizando mudanças.
O Distrito Federal ainda não possui igrejas evangélicas para gays, como existem em outros estados, mas a mentalidade dos evangélicos está mudando a partir do maior contato com o público homossexual.
A transformação é lenta e por isso a comunidade GLS deve estar atenta na luta de discutir a homossexualidade com todas as camadas da sociedade, evitando sofismas e esclarecendo o tema.
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Caminho da Graça
O reverendo Caio Fábio, um dos maiores pensadores evangélicos dos dias atuais no Brasil, em sua página na web (www.caiofabio.com.br), ao responder a carta - Será por que é mais fácil sair com homens? - de um garoto que não sabia ao certo ser gay, escreve: "O que caracteriza um gay genuinamente gay é a capacidade de se apaixonar e amar outro homem, não por causa de sexo, mas de amor mesmo".
Ele não chega a falar que não se trata de pecado, mas também não afirma. É um pequeno avanço, ainda mais se levarmos em conta que o reverendo está realizando um trabalho todo domingo em Brasília, no auditório do colégio La Salle, com um título bastante sugestivo: O Caminho da Graça.
Será o caminho da graça um caminho de consenso e respeito entre as pessoas?
"Sou evangélica e ajudei meu amigo a sair do armário"
A universitária Márcia Cristina é evangélica há mais de 10 anos e não considera a homossexualidade um pecado.
Estudante de História na faculdade Projeção, ela e outros amigos realizaram um estudo sobre o homossexual e a igreja como espaço de exclusão e contradição.
Utilizando as teorias do pensador francês Michel Foucault, o grupo analisou as práticas sociais a que o homossexual se submete e a lógica da disciplinarização do gay mediante a igreja e a sociedade.
Os estudantes abordaram a discriminação e o sentimento que pulveriza o homossexual a práticas sociais definidas por redutos isolados e espaços subterrâneos nos quais ele deve se relacionar e se divertir.
Márcia diz que já ajudou um amigo evangélico a sair do armário.
Percebendo o estado de desespero do rapaz na igreja, ela o incentivou a assumir sua identidade homossexual e afirma que, hoje, ele está muito melhor.
Realmente, há novos ventos no meio evangélico.
Prova disso é Andrea Tierno (foto), 31 anos, evangélica, casada, sem o menor preconceito contra os homossexuais.
Ela não acha que a homossexualidade seja doença e diz que provavelmente trataria até melhor os homossexuais que freqüentassem a igreja do que "outros irmãos", pelo fato dos gays não serem "mascarados".
"Numa igreja, as pessoas devem ser vistas pelo caráter", conclui Andrea.
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"Não é uma escolha"
A universitária evangélica da igreja Sara Nossa Terra, Léia Alves de Souza (foto menor) também não considera a homossexualidade um pecado.
Ela não crê que seja possível mudar a orientação sexual de um gay por não se tratar de uma escolha.
Ela diz que apesar da Bíblia afirmar que Deus não faz separação de pessoas, a igreja evangélica faz, e no caso específico dos homossexuais, um ladrão tem mais compreensão dentro da igreja do que lésbicas e gays.
A igreja evangélica pode ainda fazer vista grossa para a questão homossexual, mas alguns de seus adeptos já resolveram abrir os olhos e aceitar a imprevisibilidade do mundo, da sociedade e das relações humanas.
Você acha que a atual postura da igreja evangélica pode atrapalhar na diminuição do preconceito? Envie seu comentário ao autor do texto.